segunda-feira, 5 de abril de 2010

Ordem e Progresso...

Criada em 1889, a bandeira nacional do Brasil, que, de certo modo, simboliza o nosso NUFIB, surgiu fortemente influenciada por uma tendência de pensamento mundial, denominada positivismo.
O teórico francês Auguste Comte, filósofo e "pai" da sociologia, ou física social, como chamava, entendia que a ciência positiva era o passo final de uma ascenção humana iniciada em termos teológicos, e depois metafísicos. Entenda-se ciência positiva como a ciência que a tudo experiencia, deixando entrelinhas o projeto de que, um dia, a ciência comprenderá e abarcará a totalidade do real, dispensando os saberes filosóficos, artísticos, religiosos, míticos, e, sobretudo, o senso comum e o saber da oralidade, da técnica, e não da episteme, em noções aristotélicas.
No Brasil, quatro vertentes se desenrolaram do positivismo comteano: uma versão ortodoxa; uma política; uma militar; e uma ilustrada. Diferenças à parte, todas reportavam-se ao ideal positivista.
Nessa conjuntura, certos pensadoras tornaram-se expoentes desse ideal. Júlio de Castilho, da vertente política, e grande influência teórica para Getúlio Vargas, concebeu um projeto positivista que levava às últimas consequências o projeto de eduação das massas, num estatismo militar que coerciria as pessoas para depois ilustrá-las com as luzes do positivismo. Representantes da corrente ilustrada, como Pedro Lessa, Paulo Egydio e Alberto Sales, pretendiam efetivar no Brasil a religião da humanidade, imaginada e teorizada por Comte, em que todos na humanidade desfrutariam dessa estável, infalível e irremovível ciência. Pessoas menos informadas poderiam adorar esse projeto, mas não saberiam de certos pressupostos, a maioria etnocêntricos com os valores europeus (ociendentais e burgueses) como referência, que o respaldam e arcabouçam.
Fruto de uma mentalidade isolada, em termos teóricos, não conseguia essa tentativa de sistematização transcender suas próprias limitações, nem mesmo entender limitações para o que pretendia, e precisamente por isso, demonstrou-se o fracasso da modernidade, algo sistematicamete trabalhado e discutido pelos Frankfurtianos.
Foi nesse ambiente, em que se esperava, em pouco tempo, solucionarem-se TODOS os problemas da espécie humana, que surgiram a antropologia e a sociologia, e a política ganhou sua ciência, na tríade constituída pelas ciências sociais.
Também essa época teórica influenciou fortemente a mentalidade brasileira, algo que poderia explicar como foi tardio o surgimento das universidades no país, mesmo com o reinado ilustrado de sua majestade o imperador Dom Pedro II.
É verdade que os intelectuais nordestinos, sobretudo os da Escola do Recife, contraporam-se ao projeto positivista no Brasil. Entretanto, este foi hegemônico, e isso marca profundamente nossa identidade, mesmo porque nossa bandeira nacional é um símbolo dessa filosofia.
Suas medidas representam harmonia e equilíbrio, ideais do intelectual positivista; sua constelação milimetricamente reproduzida pode ser interpretada como a positividade da natureza, que se dá ao homem, passiva, teórica como pragmaticamente; mas a principal referência é seu lema: Ordem e Progresso. A Ordem impigida pelo Estado, a Ordem mantenedora da sociedade, como fruto da civilização. O Progresso como resultado da ciência que a tudo entende, analisa, separa e compartimentiza; o Progresso: a ascenção da humanidade; o Progresso: a fé na ciência.
Felizmente, devido talvez à não-perticipação da sociedade brasileira como um todo dessa discussão, e seu residual não-saber desses pressupostos no lema da Badeira nacional, permitiram que o Brasil não fosse positivista em seu cerne, porque, enquanto nas cidades, nos círculos intelectuais, o país se entregava a essa filosofia que, anos depois, fundamentaria o nazi-facismo, nas ruas, no campo, nas pensões, onde a vida acontecia, as pessoas viviam num ideal quase mítico, entregue a uma cosmovisão sincrética, que, por vezes opôs-se à ciência onipotente.
Por isso, e malgrado quem pensou na bandeira nacional do Brasil, ela nos representa no mundo sem dizer que o Brasil é positivista, e, muito embora o cientificismo seja a hegemonia intelectual na atualidade, isso não quer dizer que creiamos, como o positivista, que a ciência não tem limites. Muito pelo contrário, nesses anos de crise, em que a sobrevivência da espécie mesmo está em xeque, nunca deixamos tanto de lado a ciência, e nunca cofiamos tanto nela na nossa cosmovisão - e ainda assim não nos aproximamos nem remotamente da soberba positivista. Pelo mesmo motivo, podemos dizer que o blogue do NUFIB não se identifica com Comte e o positivismo.

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